Sim, eu encontrei mais

Um trio estava procurando um lugar numa floresta para acampar. Já estava anoitecendo e a cada minuto o frio se intensificava. Em algumas regiões dessa floresta havia neblina muito densa, os impedindo de enxergar algo a frente. As árvores de troncos estreitos, de um marrom escuro, eram imensuráveis.

Caminharam por longos metros até encontrarem um espaço estranho para o local. Sem árvores, um espaço onde caberia uma casa. Estranharam, pois ali era o único lugar sem plantação alguma, muito bem conservado, inclusive.

Discutiram se ali era confiável de se acampar e chegaram a conclusão de que não haveria perigo porque não era conhecido por pessoas que acampavam.

Deixaram suas mochilas em um canto e se juntaram para abrir a barraca. Demoraram alguns minutos, pois o tamanho seria para comportar quatro pessoas - para terem mais espaço. Terminaram de arrumá-la e colocaram suas mochilas dentro. Estavam exaustos, principalmente Rogério, que ajudou carregando dois baldes que suportavam vinte litros d’água. Tudo pronto para se acomodarem, foram montar o banheiro, já que o espaço era imenso. Montaram o chuveiro e tudo que fosse necessário.

O primeiro a tomar banho foi Rogério, mas por ser friorento, não conseguiu ficar por muito tempo. Se vestiu às pressas olhando atentamente ao redor com medo de algum animal aparecer. Estranhamente aquela localização era muito silenciosa. Em seguida foi a vez de Lisandra, que estava amando tudo o que estava acontecendo. Tirou suas roupas e organizadamente as deixou ao lado do chuveiro. Seu banho foi um pouco mais demorado. Estava  cantarolando animada, mas atenta ao mesmo tempo. Logo terminou seu banho, vestindo por último o seu pesado casaco. Por fim, Thales, que tomou o conhecido banho de gato. O frio já abraçava o local.

Estavam cansados, decidiram que não fariam fogueira aquela noite. Entraram na barraca, pegaram comidas, bebidas e serviram-se enquanto conversavam.

O silêncio ali era quase agoniante. Não havia som algum. Antes de dormirem, foram para fora. Estavam maravilhados com a vista. A lua parecia estar exatamente no meio daquele círculo, os iluminando como um espécime de guia. Todo o espaço estava completamente iluminado.

Aproveitaram aquele momento para caminhar e conhecer o ambiente. Pegaram algo para se defender e iniciaram a exploração.

Seguiram em linha reta, olhando atentamente por todas as direções. O silêncio permanecia.

— Quero explorar o outro lado, continuem por aqui - disse Lisandra para seus amigos.

— Acho melhor não nos separarmos, esse lugar é estranho, não tem vida animal aqui. Nem mesmo coruja nós escutamos aqui  - respondeu Rogério não gostando da ideia de sua amiga.

Thales também não gostou, mas quando estava prestes a impedir, ela não esperou e seguiu caminho.

— Se acontecer algo ou ver alguma coisa estranha, não esquece do combinado! - gritou para sua amiga.

Ela acenou de costas e sem pressa, andou já analisando cada detalhe. O lugar estava iluminado por uma luz de tom azul, saindo da lua. Parecia artificial devido ao tom intenso. O ambiente estava cada vez mais frio e mesmo com seu casaco, estava sentindo seu corpo gelar cada vez mais.

Resmungando da atitude de sua amiga, Rogério e Thales seguiram caminho na direção das árvores, onde estranhamente estava muito escuro, a luz não passava entre as folhas daquelas gigantescas árvores. Caminharam com extremo cuidado, apalpando ao redor, se apoiando nas árvores e dando passos cuidadosos. Rogério, com muito medo, se agarrou na blusa de seu amigo e o acompanhou. Thales riu da situação porque seu amigo era muito mais alto e forte do que ele.

O silêncio pairava sobre eles, nem mesmo os ventos eram ouvidos, mesmo que estivesse ventando muito. Os únicos sons eram das folhas e de passos.

— Que som é esse? É uma coruja? - perguntou Rogério, parando imediatamente após andarem por mais alguns metros.

— Como pode só existir uma coruja aqui? Como pode nenhum animal viver aqui? - respondeu Thales sem entender nada.

Olharam para cima e concluíram que era coruja de fato, parecendo ser a Suindara. O único ser que ali habitava.

— Por que aparecer justamente agora? Você sabe que coruja é agourenta, não sabe? Sem contar a completa estranheza de só ela viver aqui. Vamos sair daqui agora, por favor - disse apavorado já seguindo o caminho de volta para a barraca.

Calma, é só uma ave, não vai acontecer nada, talvez ela esteja aqui por estar machucada e encontrou refúgio neste lugar. Se acalme, vamos continuar - falou Thales, segurando o riso enquanto tranquilizava seu amigo, conseguindo fazê-lo voltar.

Caminharam por mais alguns metros e percebendo que poderiam se perder e não encontrando nada, decidiram retornar.

Rogério foi na frente, pois queria voltar logo, deixando seu amigo para trás. A pressa se tornou maior que o medo. Thales deu passos apressados para alcançar o rapaz. 

Caminhadas depois, chegaram na barraca, mas Rogério se apavorou ao chegar, quis correr para a floresta adentro. Começou suar frio e foi ao encontro de seu amigo.

— Estou dizendo que corujas são agourentas, mas ninguém acredita em mim. Vá lá e constate com seus próprios olhos. - respondeu com medo.

Thales, achando que aconteceu algo grave, apressou-se e ao chegar, se deparou com a coruja em cima da barraca deles. Suspirou de alívio e se aproximou de seu amigo.

— Não se apavore, é só uma coruja, Rogério - disse indo em direção a barraca, afastando o animal que foi embora no instante em que Thales chegara perto.


Após acenar para seus amigos, Lisandra seguiu para o lado oposto que os rapazes seguiram. Caminhou calmamente para aproveitar cada canto daquela floresta. Era o tipo de lugar que ela mais gostava de ir.

Explorou todo o lugar que ainda era iluminado, mas quando decidiu ir mais longe, notou que não havia nenhuma luz na região das árvores. Voltou para a barraca e viu que seus amigos já haviam avançado. Pegou uma de suas lanternas, mais um par de luvas e seguiu de volta.

Ligou a lanterna e começou andar entre as árvores, era tudo muito escuro e silencioso. Além das folhas, só escutava seus passos e respiração. Mas para ela era até mais tranquilizador. Seguiu seu caminho, explorando tudo o que podia, iluminando à sua frente. O que mais a fascinava era o fato da lua iluminar apenas o espaço onde estavam acampados, era um fenômeno inexplicável. E lindo.

Quis ir o mais longe que pôde, então caminhou sem pressa, analisando as árvores, as plantas, que não havia visto nenhuma daquelas antes. Pegou uma das que mais lhe chamou a atenção. Verde, de tamanho médio e com as pétalas parecendo veludo. Com a maior delicadeza, colocou no bolso do casaco, deixando apenas o botão da flor para fora. Cada metro que caminhava, encontrava uma espécie diferente, o que a deixava maravilhada, pois as plantas estavam organizadas por tipo a cada metro.

Seguiu caminho, adentrando mais ao centro da floresta, onde não havia planta alguma, somente as árvores. Constatando que não encontraria nada de muito interessante, resolveu voltar para a barraca.

Caminhou com muita cautela para não se perder, já que percorreu por longa distância. A lanterna à sua frente iluminava cada passo, mas parou quando ouviu som de coruja, sorrindo instantaneamente por finalmente escutar algum animal. O único. Parou por poucos minutos para escutá-la novamente, desta vez o som foi mais alto, mais próximo. Lisandra caminhou em direção ao canto da ave, mas não conseguia encontrá-la. Esperou por mais alguns segundos e voltou a caminhar.

No trajeto ela parava por alguns segundos ainda na esperança de encontrar a ave, mas só a ouvia. Desistiu e seguiu seu caminho, mudando a direção, no sentido oposto de onde saiu.

Se aproximando do local do acampamento, a lanterna começou a piscar freneticamente por alguns segundos e desligou em seguida. Lisandra resmungou, mas deu de ombros porque estava próxima ao seu destino. Ao chegar, tropeçou no que parecia uma grande pedra, mas ao olhar em direção, pela primeira vez desde que chegara, sentiu desespero. Levantou-se depressa, dando breves tapas na lanterna para que funcionasse novamente. Nenhum sinal. Mais algumas tentativas, porém sem sucesso. Abaixou-se em direção no que tropeçou e constatou a sua suspeita. Imediatamente assoviou como o combinado.


Seus amigos logo saíram da barraca e foram correndo em direção ao som, preocupados com sua amiga. Rogério, mentalmente, foi rezando e torcendo para não ser nada grave.

— O que aconteceu? Estávamos preocupados com sua demora. Está bem? Se machucou? - perguntava Thales, muito preocupado.

Sem dizer nada, Lisandra apenas apontou para baixo, à sua direita. Rogério entrou em pânico, começou tremer. Thales ficou paralisado, mas logo se recompôs e tentou acalmá-los. Rogério foi quem demorou mais tempo para se acalmar. Lisandra ainda estava sem acreditar.

Com cuidado, Thales, com seu pé canhoto, mexeu no item com cuidado.

— Pela minha pouca experiência, é recente - disse sem cerimônia.

— Será que tem mais? - perguntou Rogério com receio.

— Vamos procurar. Talvez esse círculo tenha a ver com isso - disse Lisandra, abaixando-se para olhar novamente, mais calma.

— E se a coruja tentou nos avisar algo? - comentou Rogério.

— Vocês também escutaram ela? - respondeu imediatamente.

— Não só ouvimos. Quando chegamos no nosso acampamento, ela estava em cima da barraca, de olhos fixos em nós - disse Thales.

Lisandra ficou pensativa ao ouvir sobre a ave.

Os três seguiram até a barraca e decidiram deslocá-la. Com extremo cuidado puxaram para a esquerda e em seguida, Rogério entrou para pegar a mini enxada que levaram.

— Vai dar um certo trabalho, então dividiremos o tempo de escavação - disse Rogério.

Começou por Thales, que conseguiu cavar por volta dos trinta centímetros. Em seguida, Rogério, que com medo de encontrar mais, cavou apenas vinte e cinco, entregando a enxada para sua amiga.

Lisandra, acostumada a usar o objeto, conseguiu ir mais longe, até sentir algo firme dentro da terra. Antes de continuar, respirou fundo, olhou para o buraco onde estava e retornou à sua tarefa.

Com extremo cuidado tirou a terra de cima do que encontrara. Parou imediatamente, suspirou e saiu do buraco no mesmo instante, confirmando as suspeitas deles.

— Sim, encontrei mais ossos no buraco.

Usando luvas improvisadas e muito cuidado, retiraram tudo o que havia e guardaram em um saco de lixo, incluindo o crânio do qual Lisandra tropeçou. Eram todos de adultos e recentes.

— Claramente fizeram algum tipo de ritual por aqui. O que faz sentido  de não acamparem neste local - respondeu Lisandra, tentando ficar calma, com receio de sua nova suposição.

      Horas depois os três se encontravam apavorados, guardando todas suas coisas às pressas, de qualquer jeito, após encontrarem ossos por toda a área do círculo.


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